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Dona Isaltina

Escrever sobre Dona Isaltina é relembrar minha infância.

Dona Isaltina era uma quituteira de mão cheia. Tudo o que fazia era de uma qualidade incrível. Sua imagem ainda hoje é nítida para mim. Sem precisar fechar os olhos a vejo adentrando o quintal dos meus avós, estatura baixa, saia até os joelhos, um lenço na cabeça branquinho tal como seus cabelos. Apoiada em sua cintura, uma bacia de alumínio, muito bem areada por sinal, e dentro: pastéis de massa caseira, bolinhos de aipim (com recheio de carne moída e seca), quibes e bolos. Seus salgados eram robustos, cheirosos, bem feitos, deliciosos. Um manjar dos deuses.  

Dona Isaltina era o elo da presença de meu avô. Como meu avô morava em outro estado à trabalho, o período em que se encontrava aqui no Rio, era o momento do aparecimento de Dona Isaltina, porque a venda total de seus quitutes era garantida. E era uma festa, tanto para a quituteira como para nós, as crianças. A comida de fato é um elemento agregador. Comer os salgados era a comunhão com o meu avô. Talvez por isso goste tanto de comer.

Infelizmente não aproveitei muito o poder agregador de Dona Isaltina. Aos 11 anos perdi meu avô e minha avó, consequentemente, as visitas da senhora quituteira já não se faziam com a frequência de antes. Até que se escassearam de vez.

Comparo Dona Isaltina a uma crônica do Lima Barreto. Marca de um subúrbio distante. Hoje, posso garantir que comer o pastel dela era uma das provas concretas da felicidade. 


Gente humilde
(Garoto -Chico Buarque- Vinícius de Moraes)


Tem certos dias
Em que eu penso em minha gente
E sinto assim
Todo o meu peito se apertar
Porque parece
Que acontece de repente
Como um desejo de eu viver
Sem me notar
Igual a tudo
Quando eu passo no subúrbio
Eu muito bem
Vindo de trem de algum lugar
E aí me dá
Como uma inveja dessa gente
Que vai em frente
Sem nem ter com quem contar

São casas simples
Com cadeiras na calçada
E na fachada
Escrito em cima que é um lar
Pela varanda
Flores tristes e baldias
Como a alegria
Que não tem onde encostar
E aí me dá uma tristeza
No meu peito
Feito um despeito
De eu não ter como lutar
E eu que não creio
Peço a Deus por minha gente
É gente humilde

Que vontade de chorar.      

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