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Morricone e o assovio do meu pai *

Meu pai sempre gostou de assoviar. Desde muito pequena o ouvia assoviando pela casa melodias, para mim, estranhas. Acho que o meu primeiro contato com a música foi através dos assovios e, também, das canções de ninar entoadas por meus pais.  Mas algumas notas eram recorrentes nos assovios de meu pai e só alguns anos mais tarde pude identificá-las. A melodia em questão faz parte da música tema do filme Três Homens em Conflito, ou O bom, o mau e o feio, composta pelo maestro e compositor italiano Ennio Morricone.

O filme, do cineasta italiano Sérgio Leone, é de 1966 e ficou rotulado como um western spaghetti. Ter Ennio Morricone como compositor de suas trilhas era uma de suas marcas. Porém, Morricone se fez por si só independente de Leone e dos westerns. Muitas de suas composições foram eternizadas. Hoje com apenas alguns trechos melódicos identificamos o filme ao qual elas pertencem. Um filme sem uma boa trilha sonora não existe. Ele pode até ter um bom roteiro, mas sem uma boa música, não acontece. Mesmo com a ausência de som, na época em que o cinema era mudo, havia um pianista unindo filme e plateia. Morricone fez e faz isso muito bem. Como não lembrar da cena em que Eastwood (O bom) aparece com seu charuto no canto da boca e o temido Lee Van Cleef (O mau) com sua arma em punho em Três Homens em Conflito? Como não lembrar do sofrido rosto de Claudia Cardinale em Era uma vez no Oeste? Como não lembrar da cena em que o jesuíta Gabriel tenta consertar seu oboé em A Missão? Como não lembrar do menino em Cinema Paradiso? Como não lembrar do melancólico De Niro em Era uma vez na América?

Em 2007 tive o privilégio de assisti-lo ao vivo regendo a OSB (Orquestra Sinfônica Brasileira) no Theatro Municipal do Rio de Janeiro cujo evento, chamado Música em Cena, o tinha como grande homenageado. Foi emocionante, ver o autor de grandes trilhas ali bem de perto. E mais ainda, tê-lo como condutor de uma viagem pelas minhas lembranças. Não contive as lágrimas. Recentemente li uma entrevista do maestro em que dizia não querer mais trabalhar com Quentin Tarantino (já havia sido autor da trilha de Bastardos Inglórios e do atual Django livre), pois o cineasta não lhe dava liberdade de criação. Como negar a liberdade de criação a um dos profissionais mais gabaritados em trilhas sonoras? Ennio Morricone se fez clássico. Devemos respeitar.

Hoje posso dizer que os assovios do meu pai foram a porta de entrada para o meu gosto pelas trilhas sonoras e para o cinema. Assim como Ennio Morricone sempre será a porta de entrada para que eu chegue ao meu pai.  


*Texto originalmente publicado na revista Música Viva da Faculdade de Música do Espírito Santo (FAMES) em dezembro de 2013.   



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